terça-feira, 24 de maio de 2016

Olhos de ressaca


Olhos de ressaca

Aqueles eram olhos de ressaca.

Ondas altas
Maré cheia
Pés descalços
Mar bravio

Aqueles eram olhos que sugavam.

Vidas fortes
Cores vivas
Muralhas
Vastos rios

Aqueles eram olhos que encantavam.

Inebriavam
Transformavam
Nada em tudo
Tudo em nada
E criavam
Imensos vazios

[Quando se afastavam]

Aqueles eram olhos de que todos precisavam.

E no dia em que lhes mergulhei
Eles estavam
Especialmente cinzentos
Ao fundo, abismo imenso
À beira, se encontrava

Vento forte
Cabelos esfumados
Lágrimas e retalhos
Leve, de pluma a quase pássaro

E então caiu
E eu pulei
Atravessei
O vidro dos teus olhos

Mas por entre os meus dedos estirados
Para longe ela escapou
Porque não caiu e, sim, voou

De garota a gaivota
Aos céus
Livre
Se lançou.
O dia clareou
E eu voltei
Para detrás das paredes de vidro daqueles olhos...

Mas aqueles eram olhos de ressaca.

Inebriavam
Transformavam
Nada em tudo
Tudo em nada
E criavam
Imensos vazios

[Quando se afastavam]

Veio, então, a agonia
Porque eu a via
Imobilizado
Por paredes de vidro
Que me mantinham afastado

Mas, inerte, não podia
Permanecer petrificado
Queimando pela necessidade de tê-la
E novamente mergulhá-la
Porque aqueles eram olhos de ressaca.

Materializou-se a agonia.
E quando eu já não a via,
As chamas me tomaram,
Mas também dor já não sentia
Eu a perdia
E me perdia
Nas cinzas daquele desvario.

No auge do delírio,
Quando nada mais havia,
Das cinzas, fênix, ressurgi.
Compreendi.
Agora, sim,
Eis que aos céus lhe poderia seguir.

Voamos lado a lado,
Separados por uma parede de vidro,
Transparente vidro frio daqueles olhos

Foi então que, de repente, percebi

Éramos uma
E juntas-una voávamos
Por detrás do infinito
Daqueles escuros olhos vivos (ondas altas, mar bravio) de ressaca.

24 de maio de 2016
Carolina Grant

quinta-feira, 12 de maio de 2016

Reflex(ã)o


Reflex(ã)o

Eu quis parar para mergulhar
No mar profundo e escuro dos teus olhos,
Mas não tive coragem

Eu quis parar para investigar
A verdade oculta por detrás dos teus olhos,
Mas tive medo (do que encontrar...)

Eu quis parar para te olhar
Mas passei a vida inteira fugindo desses teus olhos,
Porque tive receio (deste teu espelho)

Eu quis parar
Mas esses teus olhos... 
Estes teus segredos,
Os mais profundos,
Eu não quis decifrar

Eu quis parar
E você sabia
Da minha covardia
E do meu desejo

Por isso me parou
Num deslize meu
E num relance (de canto de olho)
Me prendeu 
Neste teu cruel/fascinante espelho
E eu definhei
Qual Narciso
Nesses teus olhos meus...


12 de maio de 2016
Carolina Grant